Em artigo recente, intitulado “Os pilares do combate às crises”, o reitor da Universidade Federal do Maranhão, doutor Natalino Salgado, destaca três lições importantes que devem ser apreendidas com a pandemia: “a primeira é que, em tempo relativamente curto, pode-se fazer uma revolução do bem com a educação; a segunda: em qualquer país, educação deve ser uma diretriz de Estado, independente do dirigente de plantão e a terceira: há consistência e persistência na tomada da mesma direção.” E, ainda, salienta: “Nenhum país – seja em tempos de paz ou de pandemia – pode prescindir de investimento em educação e em ciência, para reconstruir seus escombros mais rapidamente e voltar à relativa normalidade”.
Tais afirmativas estão baseadas em ciência, na historicidade de nações que superaram as mais terríveis crises sociais e econômicas, investindo na formação de sua gente. Sem invencionices ou fórmulas mágicas, esse é o caminho ideal que deve ser percorrido, respeitando a pluralidade e as diversidades que só a educação é capaz de congregar, sobretudo no espaço escolar.
Reflexão que, também, merece destaque sobre a pós-pandemia é a do juiz federal Ivo Anselmo Höhn Junior, em artigo publicado há algumas semanas, ao voltar-se para a história e seus exemplos, tais como: o terremoto, seguido de tsunami que devastou Lisboa e seus habitantes, em 1755; a peste bubônica, no século XIV, responsável por dizimar mais de 200 milhões no mundo; o elevado número de mortos da gripe espanhola; e os inúmeros impactos que todos esses episódios trouxeram para a humanidade. “Qual será o legado da primeira grande pandemia do século XXI?”, indagou o sábio magistrado.
Hoje, paira em nossos corações uma série de questões sobre o porvir: Como será o retorno às aulas? Como ficará a carga horária? De que forma vamos cumprir o conteúdo? Perdeu-se o ano letivo 2020? Esses temas ocupam, no momento, o centro dos debates em webnários, plataformas virtuais, entrevistas e artigos em periódicos de todo mundo. Cabe ressaltar que, antes de buscarmos respostas a essas perguntas, é preciso considerar o legado que a pandemia deixará e, só então, planejar o retorno à sala de aula.
Nesse sentido, há aspectos relevantes a serem observados. O primeiro diz respeito à falta de interação do estudante com outras pessoas que não sejam as de seu convívio familiar, durante a quarentena. Cito uma fala oportuna de Priscila Cruz, presidente do movimento Todos Pela Educação, em entrevista a O Globo: “A gente vem recebendo testemunhos, desabafos de mães, pais, do Brasil inteiro: os alunos estão sentindo falta de interação, inclusive com outros adultos que não os da família deles. São adultos que pensam diferente, que tem outros pontos de vista, outros lugares de fala e que podem oferecer outro tipo de acolhimento.” O outro ponto é referente ao caráter socioemocional. Diferentemente de um retorno das férias, receberemos uma comunidade escolar, saindo de um isolamento social, alguns, infelizmente, com perdas de entes queridos, amigos, ou conhecidos para a pandemia, além de outras situações difíceis vivenciadas em casa, como a violência doméstica e a fome.
Faz-se necessário que as redes de ensino considerem esses pontos específicos, primeiramente, para, então, elaborarem seus planejamentos para o pós-pandemia. A Rede Pública Estadual do Maranhão já definiu, após ouvir educadores da própria rede, que o retorno às aulas deverá ser marcado com uma semana dedicada a trabalhar o psicológico dos professores e da equipe escolar; em seguida, outra semana de acolhimento aos estudantes e suas famílias. Após esses dois momentos, será realizada a avaliação diagnóstica e de nivelamento – já planejada em parceria com o Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (CAEd/UFJF) – para identificar o nível de aprendizagem de toda a rede – quem participou de atividades pedagógicas não presenciais, das aulas pelo rádio, TV e plataformas virtuais e, também, daqueles que não tiveram conectividade ou acesso a esses instrumentos tecnológicos durante o isolamento social. Daí por diante, traçar intervenções distintas para cada nível de aprendizagem e, então, seguir o calendário letivo.
Sublinho que nossas ações não deverão mais ser dissociadas de instrumentos pedagógicos não presenciais, com uso das tecnologias, uma vez que nós, educadores, tivemos que nos reinventar lançando mão dessas ferramentas e, além de dinamizar as atividades, tivemos que buscar mecanismos de avaliação e monitoramento remotos. Esses elementos, somados à ausência do professor no dia a dia, inclusive, contribuíram para a valorização desse profissional por parte dos familiares e dos próprios educandos e atestaram que os docentes não podem ser substituídos por aparatos tecnológicos. Por outro lado, também, mostram a relevância do ensino a distância, que ganha a devida atenção, sobretudo, pela necessidade que tem de se tornar acessível em todos os sítios do país, fortalecendo a práxis da aprendizagem e a formação do educador.
A McKinsey, consultoria internacional de gestão estratégica, que já havia estabelecido cinco etapas para atravessar a crise do COVID-19, elencou cinco ‘erres’ atinentes ao retorno à escola, traduzidos e organizados pela coordenadora do CEIPE/FGV, Raquel de Oliveira e que podem ser aplicados à educação básica: “Resolver” – concentra-se na ameaça imediata à saúde que o coronavírus representa à comuniedade escolar; “Resiliência” – os educadores lidam com desafios de curto prazo, como estabelecer aprendizado remoto e apoiar os alunos vulneráveis; “Retorno” – refere-se à reabertura de escolas e à garantia de reparação pela perda de aprendizado; “Reimagine” – os líderes pensam como poderia ser o ‘próximo normal’ e como os sistemas educacionais poderiam se reinventar e, por último, não menos importante, a “Reforma”: os educadores reconsideram as prioridades da educação à luz das lições aprendidas.
Notadamente, entre os mais importantes e positivos legados da pandemia está a educação escolar, que ganha mais significado para a família, enfim, para toda a sociedade, passando a reconhecê-la como um campo social que não se faz com improviso e, sim, com planejamento construído com e para seres humanos, alicerçado com amor e solidariedade e que requer de todos nós, educadores e família, uma parceria para o desenvolvimento conjunto da competência socioemocional de nossos estudantes e filhos, sem deixar nenhum para trás ou desassistido.
Que possamos sair dessa pandemia melhores do que entramos!
Felipe Camarão
Professor
Secretário de Estado da Educação
Membro da Academia Ludovicense de Letras e Sócio do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão
Nenhum comentário:
Postar um comentário