Neste dia 8 de janeiro o Brasil relembra a tentativa de golpe contra a democracia de 2023. Golpes de Estado sempre aconteceram e sempre acontecerão. Como evitá-los?
Na manhã do dia 8 de janeiro de 2023, a população brasileira assistiu incrédula pela televisão centenas de militantes da extrema direita depredarem o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF). Mobilizadas pelo pensamento fascista, aquelas pessoas reivindicavam um golpe militar pelo retorno do ex-presidente Jair Bolsonaro. Mas, diferentemente do que aconteceu em 1964 com o general Amaury Kruel, felizmente para a democracia liberal brasileira o comandante do exército não aceitou a aventura dessa vez. Ao fim do dia 8 de janeiro, o interventor nomeado pelo presidente Lula, Ricardo Cappelli, já havia restaurado a ordem em Brasília, prendendo centenas dos golpistas que estavam nas ruas da capital.
Infelizmente, o 8 de janeiro de 2023 não foi a primeira vez que houve uma tentativa de golpe no Brasil e nem será a última. Em um de seus últimos textos escritos em vida, o famoso prefácio de “As Lutas de Classes em França de 1848 a 1850”, redigido em 6 março de 1895, Engels alertava que os verdadeiros subversivos da democracia liberal sempre foram os conservadores. Dizia Engels:
“A ironia da história universal põe tudo de cabeça para baixo. Nós, os “revolucionários”, os “subversivos”, prosperamos muito melhor com os meios legais do que com os ilegais e a subversão. Os partidos da ordem, como eles se intitulam, afundam-se com a legalidade que eles próprios criaram. Exclamam desesperados com Odilon Barrot: La legalité nous tue, a legalidade mata-nos, enquanto nós, com essa legalidade, revigoramos os nossos músculos e ganhamos cores nas faces e parecemos ter vida eterna. E se nós não formos loucos a ponto de lhes fazermos o favor de nos deixarmos arrastar para a luta de rua, não lhes restará outra saída senão serem eles próprios a romper esta legalidade tão fatal para eles” (1).
Engels estava correto e essa tem sido a história desde então. Sempre que a esquerda avança na legalidade, a direita apela para a subversão.
No Brasil, em 1945, os comunistas saíram da clandestinidade para disputar a eleição geral no país naquele momento de democratização. Consequência: elegeram 14 deputados federais e um senador, um excelente resultado na época. Claro, os reacionários não aceitaram o crescimento imediato dos comunistas na legalidade. Assim, no dia 7 de janeiro de 1948, a Câmara dos Deputados cassou, por 169 votos contra 74, o mandato dos parlamentares do Partido Comunista do Brasil.
Em 1964, as forças progressistas mais uma vez avançavam no país. O então presidente João Goulart anunciava as reformas de base e o seu partido, o PTB, crescia no parlamento em detrimento da direita. Consequência: os reacionários promoveram um golpe de Estado contra Jango com apoio da igreja, do latifúndio, das classes médias e do imperialismo estadunidense.
Em 2016, após 14 anos de governos sucessivos de um ciclo progressista liderado pelo PT, a direita apelou novamente para a subversão com um golpe parlamentar baseado no mecanismo do impeachment. Derrubaram a presidenta Dilma Rousseff para que Michel Temer, os conservadores e o capital pudessem gerir o país sem amarras.
Instituições políticas fortes são certamente importantes como trincheiras contra golpes, mas não são suficientes. Outros golpes virão. Em última instância, mais importante do que as instituições é a força material da consciência das massas na sociedade civil.
Em discurso no plenário da Câmara dos Deputados realizado em 7 de janeiro de 1948, no momento em que o mandato dos parlamentares comunistas era cassado, o então líder da bancada comunista, deputado Maurício Grabois, deixou claro qual o único caminho para a preservação da democracia: “Nesta hora, em que o regime democrático está em completa derrocada, somente o povo – e somente ele, organizado – é capaz de assegurar a democracia em nossa Pátria” (2). Nunca é tarde para aprender com Grabois.
Notas:
(1) Introdução de Friedrich Engels à edição de 1895. In: Karl Marx. As Lutas de Classes em França de 1848 a 1850.
(2) Maurício Grabois. A Cassação dos Mandatos. In: Problemas – Revista Mensal de Cultura Política nº 7 – Fevereiro de 1948.
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Theófilo Rodrigues é professor do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da UCAM. É coordenador do Grupo de Pesquisa Cultura & Sociedade da Fundação Maurício Grabois.
Infelizmente, o 8 de janeiro de 2023 não foi a primeira vez que houve uma tentativa de golpe no Brasil e nem será a última. Em um de seus últimos textos escritos em vida, o famoso prefácio de “As Lutas de Classes em França de 1848 a 1850”, redigido em 6 março de 1895, Engels alertava que os verdadeiros subversivos da democracia liberal sempre foram os conservadores. Dizia Engels:
“A ironia da história universal põe tudo de cabeça para baixo. Nós, os “revolucionários”, os “subversivos”, prosperamos muito melhor com os meios legais do que com os ilegais e a subversão. Os partidos da ordem, como eles se intitulam, afundam-se com a legalidade que eles próprios criaram. Exclamam desesperados com Odilon Barrot: La legalité nous tue, a legalidade mata-nos, enquanto nós, com essa legalidade, revigoramos os nossos músculos e ganhamos cores nas faces e parecemos ter vida eterna. E se nós não formos loucos a ponto de lhes fazermos o favor de nos deixarmos arrastar para a luta de rua, não lhes restará outra saída senão serem eles próprios a romper esta legalidade tão fatal para eles” (1).
Engels estava correto e essa tem sido a história desde então. Sempre que a esquerda avança na legalidade, a direita apela para a subversão.
No Brasil, em 1945, os comunistas saíram da clandestinidade para disputar a eleição geral no país naquele momento de democratização. Consequência: elegeram 14 deputados federais e um senador, um excelente resultado na época. Claro, os reacionários não aceitaram o crescimento imediato dos comunistas na legalidade. Assim, no dia 7 de janeiro de 1948, a Câmara dos Deputados cassou, por 169 votos contra 74, o mandato dos parlamentares do Partido Comunista do Brasil.
Em 1964, as forças progressistas mais uma vez avançavam no país. O então presidente João Goulart anunciava as reformas de base e o seu partido, o PTB, crescia no parlamento em detrimento da direita. Consequência: os reacionários promoveram um golpe de Estado contra Jango com apoio da igreja, do latifúndio, das classes médias e do imperialismo estadunidense.
Em 2016, após 14 anos de governos sucessivos de um ciclo progressista liderado pelo PT, a direita apelou novamente para a subversão com um golpe parlamentar baseado no mecanismo do impeachment. Derrubaram a presidenta Dilma Rousseff para que Michel Temer, os conservadores e o capital pudessem gerir o país sem amarras.
Instituições políticas fortes são certamente importantes como trincheiras contra golpes, mas não são suficientes. Outros golpes virão. Em última instância, mais importante do que as instituições é a força material da consciência das massas na sociedade civil.
Em discurso no plenário da Câmara dos Deputados realizado em 7 de janeiro de 1948, no momento em que o mandato dos parlamentares comunistas era cassado, o então líder da bancada comunista, deputado Maurício Grabois, deixou claro qual o único caminho para a preservação da democracia: “Nesta hora, em que o regime democrático está em completa derrocada, somente o povo – e somente ele, organizado – é capaz de assegurar a democracia em nossa Pátria” (2). Nunca é tarde para aprender com Grabois.
Notas:
(1) Introdução de Friedrich Engels à edição de 1895. In: Karl Marx. As Lutas de Classes em França de 1848 a 1850.
(2) Maurício Grabois. A Cassação dos Mandatos. In: Problemas – Revista Mensal de Cultura Política nº 7 – Fevereiro de 1948.
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Theófilo Rodrigues é professor do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da UCAM. É coordenador do Grupo de Pesquisa Cultura & Sociedade da Fundação Maurício Grabois.
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