terça-feira, 2 de setembro de 2014

Dramaturgo maranhense fala sobre projetos e a fascinação pela efervescência cultural paulistana

Maranhense Zen Salles é autor de 'Genet, o Poeta ladrão'



Radicado há mais de 10 anos em São Paulo, o dramaturgo maranhense Zen Salles vem conquistando com seu talento os palcos e a exigente cena cultural da cidade. Após encerrar temporada, a peça Genet, o Poeta Ladrão voltará a ser apresentada nos próximos meses. Sucesso de público e crítica na programação teatral paulistana, alguns de seus textos dramáticos – como Pororoca – já se tornaram objeto de pesquisas acadêmicas. E o reconhecimento parte também dos inúmeros espectadores que o abordam para expressar a admiração pela sua arte.

Mas tamanho sucesso foi alcançado com muita dedicação e trabalho. Em pleno sábado à noite, uma postagem de Zen Salles nas redes sociais funciona como escape apenas para dizer que ele está absorvido na criação de seus textos, enquanto pulsa a metrópole que tanto o fascina, palpitando arte e cultura.

Na entrevista a seguir, concedida por correio eletrônico a O Imparcial, Zen Salles trata, dentre outros temas, dos inúmeros projetos em que está atualmente envolvido, para teatro, televisão e cinema. A partir de hoje, a plateia de São Luís terá a oportunidade de assistir a uma montagem teatral baseada nos textos do dramaturgo. Com direção de Charles Melo, a Cia. Direto da Fonte apresenta o espetáculo Zen, de hoje a sexta-feira (2 a 5), às 20h, no Teatro Alcione Nazaré.

O nome da produção Zen faz alguma referência ao próprio autor?
“A culpa pelo nome Zen é do Charles Melo, diretor do espetáculo. Fiquei até surpreso quando soube, mas ao mesmo tempo me senti homenageado. Foi o Charles que teve contato com os meus textos e decidiu fazer esse projeto com a Cia. Direto da Fonte”.

Existe uma relação entre os textos que compõem a peça?
“Basicamente o que eles têm em comum é o fato da cidade de São Paulo estar bem viva em todas as cenas como um “catalisador” para as ações, apesar de a temática ser bastante universal, podendo acontecer em qualquer grande cidade do mundo”.

Sua fase atual tem sido de muito trabalho?
“Muito trabalho e são diversos textos, com projetos individuais e outros por encomenda. Por causa do enorme sucesso tanto de crítica como de público de peças como Genet, o Poeta Ladrão e Pororoca, naturalmente que recebi vários convites, a maioria em teatro, alguns em televisão e até mesmo no cinema. Gostaria de aceitar outras propostas que me foram feitas, pois realmente curto o que faço. Mas me falta tempo para tanta dedicação e, também, para o nível de qualidade que eu acabo exigindo na minha escrita”.

Pode dar exemplos de alguns desses trabalhos?
“No momento, só para citar o teatro, estou escrevendo seis peças ao mesmo tempo: Orgia, IN_Utensílios, Autofagia, Tadzio, Cora Curiosa (infantil baseado na obra de Neil Gaiman) e Unanimidade, inspirado no universo de Nelson Rodrigues. Canso só de pensar. Tudo isso também exige muita pesquisa, não é só chegar e escrever. É por isso que ando “sacrificando” até meu o sábado à noite”.

Genet, o Poeta Ladrão encerrou temporada ou segue sendo encenado?
“Tenho maior orgulho dessa peça, acho assombrosamente linda, um momento de epifania na minha carreira de dramaturgo. Mas Genet é uma peça com um elenco de dez ótimos atores, o que é bem difícil de manter. Muito deles estão fazendo novela e cinema. Foi complicadíssimo agendar uma turnê com a peça. Mas ela volta, sim, agora em outubro e novembro, para apresentações em teatros da prefeitura de São Paulo e, provavelmente, no Festival Mix Brasil”.

Um desses trabalhos atuais, Tadzio, é baseado no livro Morte em Veneza.
“Faz tempo que estou pirando e elaborando essa ideia, muito antes de escrever Genet. Fui desafiado a escrever esse texto inspirado na obra do Thomas Mann [escritor alemão] e acho que chegou o momento. Tenho curtido bastante o meu Tadzio, até porque fala de um assunto delicado e controvertido, de um cara mais velho que se apaixona platonicamente por um menino. Para alguns não deixa de se configurar como pedofilia. Só que, controvérsias à parte, já adianto que o meu Tadzio não tem nada de inocente. Ele sabe muito bem o quer. Gustav [a personagem adulta] que se cuide. (Risos)”

Conte sobre sua primeira experiência em escrever um texto em parceria, a peça Orgia, com Denise de Oliveira Freire.
“Orgia é baseado em uma notícia que viralizou rapidamente nas redes sociais sobre um bacanal protagonizado por idosos em um asilo da Inglaterra. Daí eu tive essa ideia de adaptar esse fato para a nossa realidade brasileira. Nunca tinha escrito uma peça a quatro mãos e está sendo uma delícia”.

O reconhecimento pelo seu trabalho de alguma forma o envaidece?
“Envaidece e preocupa. De repente a tua obra vira referência para quase todo mundo. Já li coisas na blogosfera como “eu quero escrever como o Zen”. É massa ler isso, mas aumenta, sim, a tua responsabilidade. Até porque, a cada trabalho, as pessoas ficam sempre esperando mais de você, criando expectativas... Isso pode ser ótimo como também ser péssimo. Mas, enfim, isso é o reconhecimento de um trabalho bem feito”.

A exposição pessoal nas redes sociais o incomoda?
Olha, acho que cada um faz o que quiser nas redes sociais. Eu as utilizo para divulgar minhas peças e, às vezes, falo o que eu estou sentindo no meu Inventário de um Dramaturgo Muito Vivo, que tem a ver mais com os dramas da minha produção criativa. O fato é que a internet é um novo canal de comunicação e eu não deixo de ser um formador de opinião, mesmo que possa me equivocar em alguns momentos... Ainda bem que ninguém é perfeito!

Em São Paulo, como seguem suas conexões com o meio artístico maranhense?
Estou aqui em São Paulo há mais de dez anos. Saí de São Luís com meus 26 anos. Trabalhei em vários jornais e fiz grandes amigos. Sempre vou aí e quase todo mundo já ouviu falar sobre a repercussão do meu trabalho aqui em Sampa, o que gera uma curiosidade natural. Até porque todos nós sabemos do alto nível da dramaturgia produzida na capital paulista, onde sou constantemente indicado a prêmios e convidado pelos maiores diretores teatrais e da tevê.

E quanto ao convite para um trabalho na Rede Globo, o que já é possível divulgar?
“Só te digo duas coisas: existe vida fora da Globo e as séries que serão produzidas nos canais fechados nos próximos anos têm tudo o que sonha qualquer roteirista e dramaturgo que se preze. [Em segundo lugar] Quando a gente entra nessas coisas, um contrato é assinado e você não pode falar nada pra ninguém. E se vazar, você pode pagar uma multa absurda”.

Experiência teatral

Zen é uma reunião de textos curtos de Zen Salles, com temática eminentemente urbana. De acordo com o autor, Agridoce trata de uma mãe que esquece os filhos dentro do carro, On $ale aborda o mundo da prostituição masculina numa grande metrópole, enquanto 1,26 foi inspirado em casos como o da assassina Suzane von Richthofen.

O diretor Charles Melo informou a reportagem que o projeto original incluía ainda a encenação de Apneia (um rapaz que perde o braço em um atropelamento na Avenida Paulista), já apresentado em montagem anterior da Cia. Direto da Fonte, conquistando a primeira colocação no Festival Nacional de Cenas Curtas, realizado em Belém (PA). No entanto, a produção manteve o texto fora da estreia por questões técnicas.

“Zen Salles vem sendo considerado um dos maiores dramaturgos brasileiros da atualidade”, disse Charles Melo, que já conhecia o trabalho a partir da montagem de Siameses e da leitura dramática de Agridoce. Para a produção de Zen, autor e diretor mantiveram contato à distância para a escolha dos textos. A trilha sonora passou por um processo semelhante, pois foi composta especialmente para o espetáculo pelo músico Eduardo Patrício, que reside na Irlanda. Apontando Zen como um trabalho de dramaturgia tradicional, Charles Melo disse que esta é a quarta produção da Cia. Direto da Fonte, que em cinco anos de atividades já realizou as peças Poema para Che, Toilet e Rimbaudemônio. Até o fim do ano, a companhia prepara a estreia da peça A Paixão segundo Alcântara, baseada em poemas de Luís Augusto Cassas, e a conclusão da montagem do filme de longa-metragem Itapecuru – Caminho de Pedras Miúdas.

SERVIÇO
O quê? Espetáculo teatral Zen
Quando? De hoje (2) até sexta-feira (5), às 20h
Onde? Teatro Alcione Nazaré (Centro de Criatividade Odylo Costa, filho – Praia Grande)
Quanto? R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia)

Fonte: O Imparcial on line

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