quinta-feira, 22 de outubro de 2020

“Só uma mente deteriorada é capaz de impedir a aquisição de vacinas”


Por Nathalia Bignon, para o 247
 

Membros do Parlamento e autoridades que transitam pelo Congresso reagiram, nesta quarta-feira (21), à postura de Jair Bolsonaro (sem partido) diante da vacina chinesa contra o coronavírus, apesar dos avanços da pesquisa.

O presidente desautorizou a compra de 46 milhões de doses da Coronavac, produzida pela farmacêutica Sinovac que seriam produzidas no Brasil pelo Instituto Butantan, sob a justificativa de que “defende a comprovação científica” do produto. A mesma comprovação que o próprio Bolsonaro ignorou ao recomendar e divulgar o uso da hidroxicloriquina.

Guerra política



Diagnosticado com Covid-19 nesta quarta, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, havia anunciado no dia anterior acordo com o estado de São Paulo para a compra do imunizante, apesar da advertência do chefe. Pazuello não apenas não seguiu o planejado, como chegou a anunciar a edição de uma medida provisória, assinada pelo presidente, para bancar a vacina.

Nos bastidores, a queda de braço política se tornou evidente. Após o presidente ter afirmado que o governo federal não comprará o medicamento, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) cancelou o encontro programado para a manhã desta quarta com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB). Em nota, a assessoria de imprensa do governo paulista informou que Maia alegou indisposição. O restante da agenda do governador na capital federal, no entanto, foi mantida.






Irresponsabilidade escancarada

“154 mil morreram pela Covid no Brasil, mas Bolsonaro continua colocando suas brigas políticas acima da vida do povo. Vacinas testadas e com segurança comprovada por institutos brasileiros devem ser disponibilizadas o quanto antes! Chega de irresponsabilidade e mortes, Bolsonaro!”, criticou o vice-líder do PSB na Câmara, deputado federal Alessandro Molon (RJ).

Convocando outros membros do Parlamento, o vice-líder do PCdoB, deputado federal Márcio Jerry (MA) defendeu uma “necessária e urgente ação, em todas as esferas, com o legislativo e judiciário incluídos, para impedir mais uma insanidade de Bolsonaro contra a Covid-19”. “Só uma mente profundamente afetada, totalmente deteriorada pelo ódio obscurantista, é capaz de impedir a aquisição de vacinas por questões ‘ideológicas’ e ‘políticas’”, pontuou.

Por meio de nota, o PCdoB afirmou que protocolou, junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), uma ação contra Bolsonaro, na qual mencionam o descumprimento de direitos fundamentais previstos na Constituição.

Novos traços de ‘psicopatia’

Para o representante do PSOL, deputado Ivan Valente (SP), a decisão torna patente a enfermidade mental de Bolsonaro. “Está comprovada a psicopatia de Bolsonaro. Depois de empurrar toneladas de cloroquina, ‘Bozo’ faz campanha contra uma vacina segura que pode salvar muitas vidas. O Brasil rasteja para Trump na guerra comercial com a China, enquanto a população fica a mercê do obscurantismo”, lamentou.

Presidente Nacional do PT, a deputada Gleisi Hoffmann (PR) não poupou na reprimenda. “Presidente estúpido, ignorante e irresponsável. Trata ideologicamente assunto de saúde pública. Faz disputa política em cima da vida das pessoas, espalhando mentira e medo. Vai fazer o que? Esperar a sobra de alguma vacina americana?!”, questionou.

A deputada federal Margarida Salomão (PT-MG) também refutou a decisão do que chamou de “governo do absurdo”. “Saúde pública não pode ser submetida a disputas políticas e preferências ideológicas. Em um governo responsável, a escolha da vacina é feita por critérios técnicos. Não é o caso do desgoverno Bolsonaro”.

Mais constrangimento para o Brasil

Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz chamou de “vergonhoso” o comportamento do chefe de Estado. “Com mais de 150 mil mortos no Brasil, Bolsonaro se presta ao vergonhoso papel – até para ele – de espalhar fake news conspiratórias sobre uma vacina tão aguardada. Cancelar a compra de vacinas por argumentos delirantes, é uma irresponsabilidade constrangedora para todo país”, resumiu.

E sobrou crítica até entre membros do Centrão. O deputado Vinicius Poit (Novo-SP) usou as redes sociais para ironizar os recorrentes “desencontros” entre membros do governo. “23h59: Ministro da Saúde anuncia que vai comprar vacina do Butantan. 00h00: Presidente diz que a vacina não será comprada e que não mantém diálogo com SP [São Paulo] sobre Covid . Já passou da hora de deixar diferenças de lado. A guerra é contra o vírus e nosso compromisso é com a vida, não com eleição”, alfinetou.

Xenofobia de Bolsonaro

Tábata Amaral (PDT-SP) defendeu a disponibilização do medicamento a partir do Sistema Único de Saúde (SUS). “A imunização contra a Covid não pode ser refém da ignorância e do oportunismo político. O que importa agora é a ciência e o trabalho sério de institutos como o Butantan. Os protocolos de testagem estão sendo cumpridos e a vacina precisa ser disponibilizada a todos via SUS!”, opinou.

No senado, o líder da oposição na Casa, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) viu um novo ato de xenofobia cometido pelo mandatário. “Além de demonstrar a falta de conhecimento e de empatia com a vida das pessoas, chamar a vacina de ‘vacina da China’ é xenofobia! A vacina está sendo produzida em parceria com o Instituto Butantan, respeitando testes criteriosos. Mais do que ignorância, é desonestidade!”, denunciou.

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