segunda-feira, 23 de maio de 2016

O médico Sérgio Barroso destaca a chegada de "Novo crash financeiro no Horizonte"

Sérgio Barroso
O Blog disponibiliza a seus leitores excelente artigo do economista e Dirigente da Fundação Maurício Grabois Sérgio Barroso acerca dos problemas econômicos da atualidade.

Boa leitura.



Novo crash financeiro no horizonte

Sergio Barroso *

Pensa o economista francês Patrick Artus que as políticas ultra expansionistas da liquidez (QE,“quantitave easing”), tocadas pelo Banco da Inglaterra, pelo Fed americano, o Banco do Japão e o BCE europeu, levaram o sistema capitalista pós crise 2007-8, a um estado de crise financeira permanente na economia mundial.[1]


Para Artus, economista-chefe do banco Natixis e professor da Universidade Paris 1-Panthéon-Sorbonne, a explosão da bolha atual dos títulos de dívida é inevitável. Autor do recente “A Loucura dos Bancos Centrais”, Artus diz que hoje há um excesso de liquidez em circulação, onde a base monetária do mundo (quantidade de liquidez criada pelos BCs) é de US$ 20 trilhões comparada a US$ 2 trilhões há 20 anos. Essa liquidez criada pelos BCs representa cerca de 30% do PIB mundial ante apenas 6% no fim dos anos 90.

Como didaticamente ele explica: 1) antes, uma bolha imobiliária criou efeito de riqueza que estimulou o consumo; 2) atualmente, a bolha dos bônus fez baixar os juros para as empresas e os governos; 3) mas “uma bolha sempre explode”: como já assistimos, em certo momento os agentes econômicos se desembaraçam de ativos muito caros “e isso explode”; 4) quem pegou emprestado “vai, com a alta de juros, pagar bem mais caro por suas dívidas”.

Nessa direção, Belluzzo e Galípolo mostram que, em “O verdadeiro estado atual do sistema financeiro” publicado no site Zerohedge, integrantes do Phoenix Capital Research negam eficácia na ideia de que se resolve o endividamento emitindo-se mais dívidas. Assim, em 2008 a bolha de bonds era de US$ 80 trilhões, hoje supera os US$ 100 trilhões; o mercado de derivativos que usa essa bolha de bonds como colateral supera US$ 555 trilhões. Informam ainda que as corporações hoje estão mais endividadas, em 2007 os bonds das empresas americanas somavam US$ 3,5 trilhões, hoje eles estão em US$ 7 trilhões, perto de 50% do PIB. “Os Bancos Centrais enfrentam os limites da política monetária para retirar a economia desse atoleiro, inundado por liquidez”, concluem Belluzzo e Galípolo. [2]

Advirto, entretanto, que Artus concentra excessivamente a ideia de crise permanente “apenas” por conta da injeção trilionária de dólares, a partir do chamado QE. Ora, esta macroeconomia fantasmagórica que se generaliza e se impõe aos bancos centrais para tirar a economia capitalista mundial desta crise sem horizonte foi seguida da política de “juros zero”; assim como vários bancos centrais pequenos já haviam adotado taxa negativa de juro, a NIRP (Negative Interest Rate), como Suíça e Suécia, tendo o Banco de Japão passado a adotá-la efetivamente.

Tanto é assim que, no último 2 de maio, o presidente do BCE Mario Draghi afirmou que nos cálculos do banco, atualmente 18% da economia global, ponderada pelo PIB, opera com políticas de taxas negativas; proporção que sobe para 40% se incluídos os países com juros entre zero e 1%.

Para Draghi, a questão central “é a demanda de investimentos insuficiente em todo mundo”, onde as baixas taxas provocam ademais pressão sobre o modelo de negócios das instituições financeiras (bancos, fundos de pensão e companhias de seguros), “apertando a receita de juros” num momento em que a rentabilidade já é fraca. [3]

Confluem tendências negativas na economia mundial
Recordemos que, início do último abril, segundo o estrategista da Nomura Securities (de Nova York), grande truste financeiro japonês, havia “claramente um elemento de ‘risk off’ (fuga de risco) presente nos movimentos do mercado”.

Indiscutivelmente, começa a se generalizar uma sensação de debacle iminente dentro do processo ininterruptamente longo da crise. O referenciado economista crítico da desregulamentação financeira J. Bradford Delong, por exemplo, evitou as meias palavras, ao declarar que chegou a hora dos bancos centrais assumirem a responsabilidade e executar a política de “jogar dinheiro por helicóptero, pondo recursos diretamente nas mãos dos que têm seus gastos limitados pelo baixo nível de renda e pela falta de ativos para garantia de crédito.

Delong diz ainda que o ex-economista chefe do FMI Barry Eichengreen há pouco declarou-se totalmente alarmado: “A economia mundial está afundando visivelmente e os formuladores de políticas públicas que deveriam administrá-la estão paralisados pelo medo”, disse Eichengreen, como se a justificar a ideia do “helicóptero” de Delong. [4]

Noutro ângulo, conforme temos insistido, apesar da manipulação sistemática dos dados da economia do império norte-americano torna-se impossível esconder a realidade de seu declínio e problemas estruturais graves. A economia dos Estados Unidos registrou, no primeiro trimestre, o menor crescimento em dois anos, o que atesta a imensa fragilidade de um alardeado “ciclo de expansão econômica”, num momento de incertezas globais.


De acordo com dados oficiais, o Produto Interno Bruto (PIB) americano cresceu 0,5% - menos da metade da taxa do trimestre anterior – devido principalmente à queda dos investimentos corporativos e das suas exportações. O quadro também foi afetado por uma desaceleração do crescimento dos gastos do consumidor, apesar de um aumento da renda pessoal.

“Estamos desacelerando desde o ano passado. Isso não é um fenômeno de um trimestre”, afirmou Joseph LaVorgna, economista-chefe para os EUA do Deutsche Bank. “É surpreendente que o consumidor não tenha se saído melhor, tendo em vista o forte crescimento do número de empregos e os baixos preços da energia”, desconversa ele. Em abril, a economia dos EUA gerou 160 mil empregos, abaixo da média de 224 mil ao longo do ano até abril, revelou Jeanna Smialek, da insuspeita Blomberg.

Indústria global segue afundando
De outra parte, a indústria no mundo todo teve desempenho ruim em abril, mostraram dados divulgados ontem para Estados Unidos, zona do euro, Japão e China, realçando as dificuldades de a economia decolar em nível global. Com a fraca demanda e o excesso de oferta, as leituras regionais devem reforçar a impressão de quem a recente retomada da economia não se sustentará facilmente e de que pode ser preciso mais estímulo.

Na zona do euro, onde o Banco Central Europeu (BCE) vem promovendo uma política de estímulo, a indústria cresceu apenas marginalmente em abril. Na China, novos dados sugerem que a economia se estabilizou em abril, em meio a uma recuperação no mercado imobiliário e do crédito. A indústria, porém, cresceu pouco. O PMI oficial ficou em 50,1 pontos, chegando segundo no campo positivo. O indicador para serviços e construção, porém, teve melhor desempenho e ficou em 53,5 pontos. No Japão o PMI medido pela Markit/Nikkei para o setor industrial caiu a 48,2 pontos em abril, em comparação a 49,1 pontos em março. O número não somente indica uma contração, como foi o pior para o setor industrial japonês em mais de três anos. [5]
China e índia enfrentam a grande crise

Por falar na China, dias atrás o Ministério dos Transportes do país anunciou que deverá injetar quase 5 trilhões de yuans (US$ 770 bilhões) na infraestrutura de transportes nos próximos três anos. O aporte sinaliza a determinação do país em usar investimentos públicos para manter a economia em plena atividade. A mais nova rodada de financiamento deverá beneficiar a debilitada indústria pesada e o setor de construção civil. Chega na sequência do anúncio pela comissão na terça-feira de que 1,6 trilhão de yuans serão investidos em 130 projetos no também necessitado cinturão industrial das províncias da região Noroeste. [6]

A economia indiana cresceu 5,3% em 2012/13; a previsão é de alcançar 7,5% por cento em 2016, tendo sido seu PIB de 7,3% em 2015. A última pesquisa econômica do Ministério de Finanças prevê um crescimento entre 7% e 7,75% no próximo ano, embora com riscos de perda. Diante do quadro atual dos Brics (crescimento negativo no Brasil e na Rússia, desaceleração chinesa e estagnação na África do Sul), a Índia vai bem, apenas porque, nas palavras de seu presidente do banco central, Baghuram Rajan, “em terra de cego, caolho é rei”.

A tormenta vindoura – e o velho Marx
Nas conclusões do economista-banqueiro francês Patrick Artus, “a próxima crise financeira será pior que a das hipotecas de alto risco” (subprime, iniciada em agosto de 2007, EUA). Nouriel Roubini afirma que muitos outros mercados (além dos BRICs, acima citados) também desaceleram desde 2013, em razão do enfraquecimento das condições externas e da fragilidade econômica, o que – diz - exacerbou “o excesso de poupança global e a crise de investimentos”.

Assim, o crash financeiro global que se avizinha, fundado na furiosa especulação no interior da enorme expansão da liquidez atual, particularmente nos países centrais, continua sua marcha inexorável. Pari passu à tendência explícita de desaceleração global. Quer dizer, uma invariância que combinaria estagnação, superacumulação/anarquia imensa na emissão de títulos (portadores de juros, portanto capital financeiro).

No entanto - e como sempre -, não se sabe exatamente quando o crash ocorrerá.

Contemporaneamente, a relação entre a taxa de juros, derivativos (contrato e aplicações de futuro), o investimento, e a rentabilidade imaginada chegaram à anarquia absoluta das previsibilidades. Na era dos ativos financeiros, a tomada de decisão capitalista da reversão de investimentos permanece mais ainda sob a tutela dos fatores contidos na subjetividade da aposta nos fatores do risco do cálculo capitalista.

Do ponto de vista do marxismo, sobre a base da superprodução ou superacumulação de capitais (máquinas, equipamentos, instalações, matérias-primas, ativos financeiros), a crise se instala quando da parada súbita que interrompe o ciclo da realização capitalista, quer dizer, a dinâmica cíclica do investimento. Noutras palavras, as crises no capitalismo não podem ser separadas da regularidade de sua dinâmica expansiva. O capitalismo, segundo Marx, objetiva produzir em larguíssima escala, até superproduzir capital. Quer dizer, sobreinvestir para fazer crescer a produtividade social do trabalho e suplantar a concorrência; superproduzir para superlucrar, superacumulando capital em excesso e em todas as suas formas, referenciando-se numa dada taxa média de lucro.

NOTAS

[1] Em:http://www.valor.com.br/financas/4553953/loucura-dos-bcs-infla-bolha-do-mercado-de-bonus-diz-professor 
[2]Em:http://www.ceapetce.org.br/noticias/a-nova-bolha-os-mercados-financeiros-afogam-se-em-liquidez-e-o-investimento-seca/
[3]Em:http://www.valor.com.br/financas/4546879/juro-baixo-e-sintoma-de-desafios-da-economia-global-diz-draghi 
[4]Em:http://www.bresserpereira.org.br/terceiros/2016/maio/16.05.Dinheiro-farto.pdf
[5]Em:http://www.valor.com.br/internacional/4547109/demanda-cai-e-afeta-industria-global
[6]Em:http://www.valor.com.br/internacional/4559043/pacote-de-estimulo-preve-gastos-de-us-770-bi-em-transportes-na-china


*** Médico, doutorando em Economia Social e do Trabalho (Unicamp), membro do Comitê Central do PCdoB

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